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- 1º Grau
TRF1 • PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL • DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATRIAS DE DIREITO PÚBLICO (9985) • 1041469-28.2020.4.01.3400 • Vara Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª Região - Inteiro Teor
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PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Distrito Federal
23a Vara Federal de Juizado Especial Cível da SJDF
SENTENÇA TIPO B
PROCESSO : 1041469-28.2020.4.01.3400
CLASSE : PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436)
POLO ATIVO : ROMEU DOS SANTOS FILHO
REPRESENTANTES POLO ATIVO : JOSE DIRCEU DE PAULA - SP81406
POLO PASSIVO :UNIÃO FEDERAL
SENTENÇA
Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº. 9.099/95, e tratando-se de causa que exige urgência no julgamento, nos termos do art. 12, § 2º., inciso IX, do NCPC, por se tratar de pretensão de caráter alimentar, procedo ao julgamento da lide.
Tratando-se de matéria conhecível de ofício, verifico que a prescrição na espécie é quinquenal, por força do art. 1º do Decreto nº. 20.910/32, porém não atinge o fundo de direito, vitimando apenas as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.
No mérito restante, inteira razão assiste à parte autora.
De fato, o dever do Estado de garantir a educação infantil em creche e pré-escola até os cinco anos de idade tem assento na Carta Constitucional (art. 208, inciso IV, CF) e a gratuidade desse direito está garantida até os seis anos de idade na legislação infraconstitucional, quais sejam, a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96, art. 4º, inciso IV) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº. 8.069, art. 54, inciso IV).
Todavia, o Decreto nº 977/93, ao regulamentar a assistência pré-escolar destinada aos dependentes dos servidores públicos da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, transferiu parte dessa obrigação do Estado para o servidor.
Evidentemente o decreto citado dispôs de forma diferente das leis que regem a matéria, uma vez que impôs ao servidor o custeio de parte do auxílio creche, enquanto o Legislador previu a gratuidade dessa assistência, ofendendo, assim, o princípio constitucional da legalidade (art. 5º, inciso II, da Carta de 1988). Nesse sentido já decidiu o TRF da 1a Região:
PREVIDENCIÁRIO - TRIBUTÁRIO - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO ORDINÁRIA - SERVIDOR PÚBLICO (PODER JUDICIÁRIO FEDERAL) - AUXÍLIO CRECHE OU PRÉ-ESCOLAR - IRRF E CUSTEIO: INDEVIDOS - RESTITUIÇÃO: DECADÊNCIA "5+5" E SELIC.
(...)
3 - É obrigação do Estado garantir o atendimento educacional em creche e pré-escola às crianças de zero a 06/05 anos (art. 208, IV, da CF/88, c/c art. 54, IV, da Lei nº 8.069/90), ônus intransferível aos servidores.
4 - O Decreto nº 977/93 (art. 1º, art. 4º e art. 7º) estipulou assistência indireta educacional aos dependentes dos servidores públicos, via percepção de auxílio (creche ou pré-escolar) em pecúnia. (caso do auxílio creche ou pré-escolar, instituído para sanar a omissão estatal em cumprir o encargo da oferta regular satisfatória de qualidade do "atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a 06 anos).
6 - O art. 6º do Decreto nº 977/93, norma secundária ou de execução da lei (art. 84, IV, da CF/88), é ilegal ao, extrapolando sua função regulamentar, estatuir custeio do beneficiário, dado que, restringindo ou onerando o gozo do direito previsto na Lei nº 8.069/90 (e na CF/88), invadiu seara de lei (norma primária), contrariando-a ou mitigando seus efeitos.
7 - Tomando-se em consideração que toda indenização tem como escopo" ressarcir um dano ou compensar um prejuízo "(no caso, a omissão estatal), ecoa antinomia que se pretenda imputar" custeio "para verba que a jurisprudência afirma" indenizatória ", repartindo-se com quem não deu causa ao dano/prejuízo o ônus de sua recomposição. E, ainda que se pudesse admitir a instituição do ônus, tal demandaria - se e quando - lei expressa (que não há, irrelevante a só previsão regulamentar).
8 - Em tema de tributos (e ônus congêneres), a CF/88 exige atenção à legalidade e à tipicidade (art. 146, III, a, c/c art. 150, I).
9 - Como, respeitada a decadência, todo o indébito foi gerado no período em que já vigorava a Lei nº 9.250/95, a atualização monetária da restituição se fará apenas pela aplicação da SELIC, sem cumulação com juros de mora ou indexadores monetários outros.
10 - Apelação e remessa oficial não providas.
11 - Peças liberadas pelo Relator, em 14/09/2010, para publicação do acórdão. ( AC 0009875-13.2006.4.01.3300/BA, Rel. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral,
SÉtima Turma, e-DJF1 p.143 de 24/09/2010).
Em conclusão, o citado decreto não pode impor ao servidor o custeio de parte do auxílio creche, uma vez que o legislador previu a gratuidade dessa assistência.
Finalmente, o direito da parte autora está sob risco de lesão, haja vista que a União continua a cobrar o custeio do auxílio creche, à falta de uma decisão vinculante por parte do órgão de cúpula do Poder Judiciário Brasileiro.
Em face do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, razão pela qual CONDENO a UNIÃO a abster-se de cobrar e a restituir os valores cobrados a título de custeio do auxílio creche (cota parte do servidor), respeitada a prescrição quinquenal.
As parcelas vencidas, a serem pagas mediante RPV, serão acrescidas de correção monetária pelos índices do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal a contar das datas dos respectivos vencimentos e até a entrada em vigor da Lei nº. 11.960/09, a partir de quando será aplicado o índice definido por ocasião do julgamento, pelo e. STF, dos embargos de declaração interpostos contra o acórdão proferido no RE nº. 870.947-SE, e de juros de mora de 0,5% ao mês a partir da citação.
Tendo em vista que os valores a serem repetidos evidentemente não discrepam da alçada do JEF, em razão do pequeno valor da incidência questionada, deixo de proceder á imediata liquidação do julgado, já que ausente o risco de desqualificação da competência deste Juízo. Sem custas e sem honorários, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, aplicável à matéria por força do art. 1º da Lei nº. 10.259/01.
Indefiro o pedido de assistência judiciária gratuita, uma vez que o autor recebe proventos superiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais), conforme contracheque acostado aos autos.
Interposto recurso inominado, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo de 10 (dez) dias (art. 42, § 2º, Lei nº. 9.099/95) e, decorrido o prazo, remetam-se os autos à Turma Recursal, independentemente de juízo de admissibilidade, salientando que eventual efeito suspensivo será apreciado pelo juiz relator, nos termos dos artigos 1.010, § 3º e 1.012, § 3º, ambos do NCPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.