15 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Tribunal Regional Federal da 1ª Região TRF-1 - APELAÇÃO CRIMINAL (ACR): APR XXXXX-97.2013.4.01.3603
Publicado por Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
QUARTA TURMA
Publicação
Julgamento
Relator
DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES
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Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO (ART. 149, DO CÓDIGO PENAL). AUSÊNCIA DE PROVAS PARA IMPOSIÇÃO DE UMA CONDENAÇÃO. ABSOLVIÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.
1. O Ministério Público Federal apela da sentença que absolveu o acusado da apontada prática do crime previsto no art. 149 do Código Penal, com fundamento no art. 386, incisos III e VII, do Código de Processo Penal.
2. Segundo a denúncia, "no período compreendido entre o mês de outubro a 1º de dezembro de 2010, na Fazenda Visconde de Mauá, localizada na zona rural de Nova Canaã do Norte/MT, o denunciado DELCIANO DE AZEVEDO, agindo de modo livre e consciente, reduziu pelo menos 02 (dois) trabalhadores a condição análoga à de escravo, sujeitando-os a condições degradantes de trabalho, na forma do artigo 149 do Código Penal".
3. Na sentença, o magistrado entendeu que, efetivamente, foi encontrado um cenário de descumprimento de normas básicas relacionadas à saúde, segurança, higiene e conforto no ambiente de trabalho. Contudo, entendeu que não ficou comprovada a ocorrência do crime de redução a condição análoga à de escravo.
4. No caso, a denúncia está embasada na fiscalização realizada pelo Ministério Público do Trabalho no local dos fatos, onde foram colhidos elementos sobre a suposta ocorrência do delito em apreciação. A ocorrência dessa espécie de delito afere-se principalmente pelos depoimentos das vítimas e das testemunhas que presenciaram os fatos.
5. As testemunhas de acusação relataram em juízo circunstâncias que configuram o descumprimento de normas trabalhistas e ausência de condições dignas de trabalho, todavia desacompanhadas de provas que demonstrem a persistência e intensidade a demonstrar a violação de direitos humanos, para se concluir pela prática do crime de redução a condição análoga à de escravo, previsto no artigo 149, caput, do Código Penal.
6. A única vítima ouvida em juízo declarou que "que se recordava um pouco do dia da fiscalização feita pelo MPT na Fazenda Visconde de Mauá" "que o barraco ficava na beirada da mata, tinha um córrego próximo, os trabalhadores dormiam em redes e que não tinha armários porque no meio do mato não tem isso não". Quanto à alimentação declarou que o contrato foi de "empreita" então "o trabalhador pegou a empreita né, aí eles mesmos levava a despesa". Afirmou ainda que "estavam contentes em morar ali".
7. Ao que parece, ocorreram algumas irregularidades e violações à legislação trabalhista (ausência dos registros na CTPS, alojamentos e refeitórios com precárias condições de higiene e saúde, ausência de fornecimento de equipamento de proteção individual); entretanto, tais irregularidades não são suficientes para caracterizar o crime capitulado no artigo 149 do Código Penal.
8. Sem provas inequívocas de que os contratados tenham sido forçados a trabalhar ou a cumprir jornadas extenuantes a contragosto, em condições degradantes de trabalho ou tenha-lhes sido restringida a liberdade de locomoção, não há como imputar ao réu a acusação de infringir o art. 149 do Código Penal. O direito penal funciona como última ratio dentro do Ordenamento Jurídico, somente sendo aplicado quando as demais áreas não sejam suficientes para punir os atos ilegais praticados.
9. Está correta a sentença, pois o conjunto probatório constante dos autos não oferece elementos de prova hábeis a demonstrar, com a necessária segurança a fundamentar uma condenação, que o acusado teria praticado ou concorrido, consciente e voluntariamente, para a prática do delito em análise, não sendo, portanto, suficiente para ensejar a condenação.
10. Cumpre destacar que no processo penal vige a regra do juízo de certeza, ou seja, as provas devem ser produzidas de maneira clara e convincente, não deixando margem para meras suposições ou indícios. Para que se chegue ao decreto condenatório, é necessário que se tenha a certeza da responsabilidade penal do agente, pois o bem que está em discussão é a liberdade do indivíduo. Sendo assim, meros indícios e conjecturas não bastam para um decreto condenatório, uma vez que, na sistemática do Código de Processo Penal Brasileiro, a busca é pela verdade real.
11. Apelação desprovida.
Acórdão
A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação.